terça-feira, 10 de setembro de 2013

Boccaccio

Giovanni Boccaccio
1313 - Em Paris, ou Florença, nasce Giovanni Boccaccio, filho de Boccaccino de Chellino e de mãe desconhecida.

1320 - Boccaccio casa-se com Margarida dos Mardoli.
1327 - No fim do ano, ou em princípios de 1328, Boccaccio vai a Nápoles, estudar comércio.
1336 - Escreve A Caça de Diana. Conhece Maria (ou Giovanna) d´Aquino, imortalizada por ele como Fiammetta. Começa a escrever o Filócolo.
1337 - Dá início a Filóstrato, concluído em 1339.
1339 - Boccaccio inicia o poema Teséida, terminado em 1340.
1341 - Boccaccio retorna a Florença. Escreve Ameto.
1342 - Escreve Amorosa Visão.
1344 - Compõe o romance Elegia de Madonna Fiammetta.
1345 - Inicia As Ninfas de Fiésole.
1348 - Peste em Florença. Boccaccio começa a escrever Decamerão (*). Morre sua filha Violante, com sete anos de idade.
1349 - Morte de Boccaccino.
1350 - Primeira missão diplomática, em Ravena. Torna-se amigo de Petrarca.
1351 - Começa a escrever as Éclogas.
1353 - Publica o Decamerão.
1354 - Missão oficial em Avignon. Escreve O Labirinto do Amor.
1355 - Compõe em latim dois tratados e um dicionário: Sobre a Infelicidade dos Homens Ilustres, Da Genealogia dos Deuses Pagãos e O Livro das Montanhas, das Florestas, das Fontes, dos Lagos, dos Rios, das Lagoas ou dos Pântanos e dos Nomes dos Mares.
1362 - Redige parte de Mulheres Célebres.  Realiza viagens diplomáticas. Recebe a visita do  monge Gioachino Ciani.
1373 - Em outubro, inicia a série de conferências sobre A Divina Comédia. Começa a escrever o Comentário.
1374 - Em julho, interrompe as conferências e retira-se para Certaldo. Morre seu amigo Petrarca.
1375 - Em 21 de dezembro, morre Giovanni Boccaccio.

(*) Decamerão
Decamerão é um conjunto de cem novelas em que Boccaccio narra a história de sete mulheres e três homens que, fugindo da peste, em 1348, retiram-se para o campo, nas proximidades de Florença.
Durante dez dias cada um conta uma história.
Essas novelas - sentimentais, satíricas, trágicas ou licenciosas - retratam a vida no século XV, num estilo que se tornou modelo na prosa italiana.


O rio arno corre, refletindo em suas águas mansas as múltiplas pontes e o casario dourado das ruas de Florença. A agitação das pessoas nas ruas e nos locais de trabalho contrasta com a mansidão do rio. Grupos de mercadores discutem preços de tecidos. Vendem sedas do Oriente, pérolas da China e especiarias da índia. Nas casas, os cofres estão abarrotados. Vender dá dinheiro. Muito dinheiro. Os reis da Europa constantemente enviam seus emissários aos banqueiros florentinos a fim de que consigam empréstimos. Muitos são aqueles que abandonam o trabalho dos campos, que rende pouco, e dos mais remotos lugares da Itália partem para a cidade à procura de riqueza. E em Florença o dinheiro corre como as águas do Arno.

Boccaccino da Chellino saiu de Certaldo, um povoado agrícola, e empregou-se na casa bancária Bardi, em Florença. Ficou rico em pouco tempo e pôde então realizar um sonho antigo: viajar pela Europa. Esteve em Paris, onde frequentou altas rodas da nobreza. É provável que tenha se apaixonado por uma dama da aristocracia e com ela tenha rido um filho em 1313. Mas o mais provável é que, ao regressar á Itália, tenha tido uma aventura amorosa, em Certaldo ou em Florença. De qualquer modo, tanto o pai como o filho sempre alimentaram o mistério em torno dessa mãe desconhecida e do local do nascimento de Giovanni Boccaccio.

Com uma criança pequena para cuidar, Boccaccino resolveu casar-se. Escolheu para companheira Margarida dos Mardoli, ilustre na história das letras não só porque se tornou a madastra de Giovanni Boccaccio mas ainda por ser parente de Beatriz, a amada imortal de Dante Alighieri. O menino crescia saudável e inteligente, mas a vida em casa era opressiva; o pai só se preocupa com dinheiro, com negócios e com lucros; a madastra não lhe dava afeto. Foi com alívio, portanto, que acolheu a idéia de aprender a ler, escrever e calcular, sob a orientação de Giovanni da Strada, renomado mestre-escola. Mal iniciara os estudos e Boccaccio já começava a rabiscar suas primeiras histórias. Mais tarde declarou que, aos setes anos de idade, imaginava fábulas e escrevia pequenos contos para fugir ao ambiente rígido e ambicioso que o cercava.

Tendo alcançado tão facilmente a fortuna como bancário em Florença, Boccaccino desejava que o filho seguisse o mesmo caminho. Enviou-o a Nápoles em fins de 1327 ou no início do ano seguinte, onde deveria aprender comércio e finanças numa das dezesseis sucursais da casa Bardi. A Itália era então formada pelo reino de Nápoles - cujo domínio abrangia o sul da península e a ilha da Sicília - e por uma série de unidades políticas autônomas, lideradas por cidades economicamente poderosas, como Veneza, Gênova e Pisa. A cidade de Napóles, capital do reino, embora menor que Florença, não tinha menos encantos.

Boccaccio encantou-se. Como dedicar-se aos estudos financeiros com tantos coisas belas e agradáveis ao redor Solicitou ao pai permissão para estudar na universidade; Boccaccino concordou, ma impôs-lhe o curso: Direito Canônico. Ainda que não lhe agradasse, o rapaz aceitou a imposição. Preferia estudar uma disciplina aborrecida a continuar lidando com cifras e cálculos, letras de câmbio e promissórias. Ademais, não tinha intenção de frequentar as aulas; queria só conhecer o ambiente universitário, onde era mais provável encontrar amigos que entre os jovens aspirantes a financistas. As amizades dessa época foram-lhe extremamente valiosas, como a de Paolo de Perúgia, bibliotecário real que lhe propiciou a leitura dos manuscritos raros das obras famosas, dos romances franceses com tradução italiana e da poesia trovadoresca em dialeto provençal. Para melhor aproveitar os textos clássicos, estudou latim, e mais tarde aprenderia grego. Desprezando o êxito fácil das finanças, abandonou o comércio e livrou-se de trabalhar na casa Bardi. Dedicou todo o seu tempo á atividade literária, pela qual se sentira atraído desde a infância.

Frequentar a universidade representava, além de fazer amigos, encontrar a oportunidade de se introduzir na corte napolitana. Não escondia sua admiração pela nobreza que decidia e governava. Seu amigo Niccolò Acciaioli, filho de importantes banqueiros florentinos, tinha livre acesso à corte, e não lhe foi difícil apresentar Boccaccio. Os fidalgos receberam com simpatia o jovem de maneiras elegantes, expressão sorridente e conversa agradável. Mais tarde, no Decamerão, haveria de recordar com saudade esses tempos felizes: as vilas à beira-mar, as grandes festas, os jardins perfumados ao luar e as pessoas que o acolheram e lhe propiciaram todos aqueles prazeres que lhe incendiavam a imaginação.

Sempre alegre, cativante, gentil e de bela figura, Boccaccio fazia versos, em que enaltecia a beleza das mulheres de Nápoles: com A Caça de Diana, poema de dezoito cantos, tocou fundo o coração de muitas damas, que por ele suspiravam incessantemente O poeta ouvia os suspiros e respondia somente ocm sorrisos e promessas.

Em um sábado santo de 1336, ao entrar na Igreja de São Lourenço, viu uma mulher lindíssima, de expressão misteriosa e fascinante. Chegara sua vez. A formosa senhora, ao que se dizia, era filha ilegítima do rei de Nápoles, casada com um rico fidalgo local. Maria ou Giovanna d´Aquino - nunca se soube ao certo seu nome - imortalizou-se como Fiammetta na obra do poeta, marco de uma nova conceção amorosa, na história da literatura.

Ao cantar em versos as peripécias desse amor, o autor rompeu com uma tradição: em vez de fingir poeticamente um sentimento casto e cavalheiresco, quase místico, livre de qualquer perturbação sensual, como o fizeram poetas anteriores, exaltou uma paixão ardente e carnal. Fiammetta não ficou insensível aos versos do poeta. Deixou-se cortejar, feliz com tantas atenções. Com sorrisos promissores e olhares ansiosos, acendeu no jovem a esperança do amor. Boccaccio seguiu-a por toda parte, abandonou os amigos e os livros. Um dia, indo atrás dela, foi ter a um convento, onde, segundo o costume da época, as mulheres da nobreza se reuniam para conversar e ouvir fábulas, Nesse dia foi narrada a lenda de Flório, o filho de um rei sarraceno que e apaixona por Brancaflor, filha de uma escrava cristã.O pai de Flório, tentando impedir o namoro, mandou o jovem estudar londe e vendeu amoça a mercadores babilônios. Não se deixando vencer, o príncipe procurou a amada incansavelmente. Encontrou-a por fim, casou-se com ela e viveram felizes até a morte. Fiammetta, após ouvir tão bela história, lamentou-se com as amigas de que essa lenda não estivesse escrita em italiano. Estando Boccaccio presente, perguntou-lhe então se não gostaria de fazer a versão popular da lenda. Como resistir a um pedido de Fiammetta. Atendeu-o e escreveu em língua italiana a novela Filócolo: delicada história amorosa de duas personagens lendárias, mas, na realidade, relato de amor de Boccaccio por Fiammetta.

Entretanto, Fiammetta abandonou-o e partiu para uma longa viagem. O poeta extravasou sua mágoa no Filóstrato, poema de nove canos, composto talvez em 1338. Como se não bastasse a ausência da amada, Boccaccio, pela primeira vez na vida, teve problemas financeiros. Os bancos Peruzzi e Bardi haviam feito vultoso empréstimo ao rei da Inglaterra, então em guerra contra a França, e não receberam o dinheiro de volta. Boccaccio, por isso, ficou sem a ajuda paterna. Deixou de frequentar a corte e mudou-se para um bairro pobre. De 1339 a 1340 viveu numa ruela estreita e suja, entre pregões de vendedores e mendigos, bêbados e crianças esfarrapadas. Tudo o que escreveu nesse tempo foram queixas e lamentações, nos doze cantos do poema Teséida e em cartas que enviava constantemente para os seus diversos amigos.

Florença, que conhecera tanto esplendor durante muitos anos, estava à beira da falência. Os bancos fecharam as portas um após o outro, os mercadores não achavam clientela, os camponeses não tinham o que colher. Lutas internas, revoltas, epidemias. Boccaccio achou melhor ter o filho a seu lado. O poeta voltou contrariado.

A desilusão com sua cidade e a saudade de Nápoles e de Fiammetta não o impediram de notar as belas mulheres florentinas. Não casou com nenhuma, mas em sua obra alude a várias aventuras. Uma delas resultou numa filha, Violante, morta aos sete anos de idade.

Platão e Aristóteles em grego; Plauto, Ovídio, Cícero, Horácio e Santo Agostinho em latim. Compôs Ameto, Comédia das Ninfas Florentinas e Amorosa Visão - elegia dedicada a Fiammetta.
Em 1348 Boccaccio começou a elaborar sua obra-prima, o Decamerão. Imaginou um grupo de sete moças que, tentando afastar-se dos perigos da epidemia que grassava em Florença á época, se encontram com três rapazes, "não por prévia combinação, mas por acaso, em uma das dependências da Igreja de Santa Maria Novella", e decidem seguir, em busca do ar livre, para uma propriedade agrícola perto da cidade. E ali, durante dez dias, contam histórias de amor.


O conjunto desses relatos, que perfazem o número de cem, foi intitulado pelo autor Decamerão, que significa, em grego, "dez dias"."É coisa que causa maravilha ouvir o que devo dizer..." No prólogo explica que inventou as histórias para servir de consolo e distração às pessoas infelizes no amor, sobretudo às mulheres, que, por imposição social, reprimiam os sentimentos amorosos, ao contrário do qeu ocorria com os homens. 

Terminada a peste, Boccaccio voltou a Florença no outono de 1350, onde se tornou amigo de Francesco Petrarca. Ambos, juntamente com Dante, formam a grande tríade poética da Itália, no início do Renascimento. No mesmo ano foi nomeado embaixador do governo florentino na cidade de Ravena. Era o início de uma série de viagens diplomáticas pela Itália, a serviço de Florença. Nos intervalos das missões, continuava escrevendo. Dessa época data o Corbaccio ou Labirinto do Amor, história de um velho apaixonado e desdenhado por uma jovem; o amor, nesta obra, reflete as desilusões do autor. E aparecem também as Rimas, revelando a incipiente crise religiosa: Boccaccio tentava inutilmente conciliar apelos da natureza com normas da religião. Os longos estudos da literatura latina resultaram em dois tratados e um dicionário geográfico, redigidos em latim: De Casibus Vivorum Illustrium (Sobre a Infelicidade dos Homens Ilustres), Genealogia  Deorum Gentilium (Genealogia dos Deuses Pagãos), e o Livro das Montanhas, das Florestas, das Fontes, dos Lagos, dos Rios, das Lagoas ou dos Pântanos e dos Nomes dos Mares, escrito com o intuito de facilitar o reconhecimento dos locais que são citados pelos autores clássicos.

Em 1362 Boccaccio recebeu uma estranha visita.O monge Gioachino Ciani procurou-o para lhe dizer que um santo homem da cidade de Siena, Pietro Petroni, falecido fazia pouco tempo, havia tido visões proféticas sobre o destino do poeta. De acordo com Petroni, o amor do Decamerão teria pouco tempo de vida e deveria consagrá-lo ao estudo dos livros religiosos, abdicando das letras profanas. A crise religiosa, delineada desde 1350, finalmente explodia. Compreendendo a impossibilidade de conciliar os prazeres sensoriais com os preceitos cristãos, Boccaccio decidiu abandonar o mundo e retirar-se para um convento. Antes de fazê-lo, contudo, quis saber a opinião de Petrarca. O amigo conseguiu dissuadi-lo do projeto, mostrando-lhe que sua verdadeira vocação estava longe de ser a vida religiosa, e que ele poderia muito bem realizar obras boas sem se abster da literatura ou do amor. E Boccaccio continuou no mundo, sem nunca mais ter demonstrado qualquer indício de crises ou de problemas religiosos.


Entre 1351 e 1366 escreveu Éclogas, em latim, refletindo acontecimentos políticos ou narrando fatos de sua vida pessoal. Em 1362 redigiu grande parte De Claris Mulieribus (Mulheres Célebres): 104 biografias de mulheres famosas por seus vícios ou virtudes.

No fim de 1373, cansado da vida e duvidoso da glória, Boccaccio aceitou um convite da comuna de Florença para fazer uma série de conferências sobre a Divina Comédia, de Dante, na Igreja de Santo Stefano de Badia. Ao mesmo tempo redigia o Comentário, sobre o mesmo assunto, que pretendia fosse a maior obra sua em língua italiana, depois do Decamerão.

Mal chegou a comentar o décimo sétimo canto do "Inferno". Em junho de 1374, obrigado pela saúde precária a interromper as conferências, retirou-se para Certaldo, onde recebeu a notícia da morte de Petrarca. A perda do amigo foi tema de sua última obra literária, um belíssimo soneto. Não escreveu mais. Ficou ali, silencioso e solitário, olhando ao longe os campos e as montanhas da Toscana, até morrer, no dia 21 de dezembro de 1375.

Fonte: coleção obras-primas - grandes autores - vida e obra.

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