sexta-feira, 13 de março de 2015

Gabriel García Márquez - Eu não vim fazer um discurso

Gabriel García Márquez

A revista Cidade Nova, na sessão de literatura, por Fernanda Pompermayer, apresenta a obra do mestre Gabriel García Márquez, "Eu não vim fazer um discurso", editora Record, Rio de Janeiro, 2011.
"Em época de posses ministeriais e parlamentares o que mais se ouve é discurso. E aí o título do grande escritor colombiano García Márquez traz té um alívio: Eu não vim fazer um discurso. Aliás, traria, se não fosse um blefe, um feliz blefe. Na verdade a obra consiste  na coletânea de discursos feitos pelo Prêmio Nobel de Literatura em diversas ocasiões e latitudes. Incluindo, claro, o de Estocolmo, quando da entrega do Nobel. Mas ouvir discursos do autor de Cem anos de solidão é música suave agradabilíssima para ouvidos afeitos à literatura. E, no caso desse livro, é quase um diálogo com Gabo, como era chamado pelos mais íntimos.
São "conversas" que abarcam quase 60 anos de sua experiência e do eu pensamento como jornalista e escritor. Ele carrega no peito - e transborda em palavras - o sofrimento de um homem latino-americano que atravessou o século XX. Que viveu os tempos de um "primeiro mundo" de abundância e felicidade para alguns e de um "terceiro mundo" de exploração, fome e abandono à própria sorte para milhões outros. E com essa consciência e sentimentos - que ele descreve como "o nó da nossa solidão" - avança no tempo e entra no século XXI.
Em 1970, no Ateneu de Caracas, descreve como começou a escrever: com um conto para o jornal El Espetador, de Bogotá. Ao inaugurar, em Paris (1999), o seminário "América Latina e Caribe diante do novo milênio", prova que nunca ala por falar... "Nos anos quarenta" - inicia calmamente - "O escritor italiano Giovanni Papini enfureceu nossos avós com um frase envenenada: "A América é feita das sobras da Europa"." Cita Simón Bolivar ao definir que nós, latino-americanos, "somos um pequeno gênero humano". Acredita na redenção e no futuro de um continente cujos primeiros haitantes europeus, em sua grane maioria eram degredados, e por isso finaliza sua fala conclamante: "Não esperem nada do século XXI, pois e o século XXI que espera tudo de vocês. Um século que não veio pronto de fábrica, veiopronto para ser forjado por vocês á nossa imagem e semelhança, e que só será tão pacífico e nosso como vocês forem capazes de imaginá-lo."
O discurso de Estocolmo, em 8 de dezembro de 192, foi á altura da sua obra-prima. E, em consonância com ela, intitulado: A solidão da América Latina. O colombiano revista cinco séculos de história de exploração, discriminação e abandono, recapitulado métodos, etapas, eventos O clima era de Guerra Fria, ditaduras militares em muitos países da América Latina e da África, disparidade econômica brutal entre o norte e o sul do mundo. Nesse contexto, o Colombiano ergueu a voz e se fez ouvir, sem se preocupar com eufemismos.
"A interpretação da nossa realidade a partir de esquemas alheios só contribui para tornar-nos cada vez mais solitários. Talvez a Europa venerável fosse mais compreensiva se tratasse de nos ver em seu próprio passado. Se recordasse que Londres precisou de trezentos anos para construir sua primeira muralha e de outros trezentos anos para ter um bispo, que Roma se debateu nas trevas da incerteza durante vinte séculos até que um rei etrusco a implantasse na História, e que em pleno século XVI os pacíficos suíços de hoje, que nos deleitam com seus queijos mansos e seus relógios impávidos, ensanguentaram a Europa com seus  mercenários". "E ainda assim, " - concluiu - "diante da opressão, do saqueio e do abandono, nossa resposta é a vida. Nem os dilúvios, nem as pestes, nem os cataclismos, nem mesmo as guerras eternas através dos séculos e séculos, conseguiram reduzir a vantagem tenaz da vida sobre a morte."



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